Métodos diretos de investigação do subsolo – Ensaio DMT

Dando prosseguimento a nossa série de artigos sobre métodos diretos de investigação do subsolo, abordaremos neste artigo o ensaio DMT – (ensaio Dilatômetro de Marchetti), que vem sendo amplamente difundido no mundo inteiro, mas ainda com utilização limitada no Brasil. Apresentamos o referencial teórico que embasa tecnicamente o ensaio (além da formulação matemática para cálculo dos fatores), a metodologia de execução, descrição dos equipamentos e softwares utilizados nas análises, são apresentadas potenciais vantagens e desvantagens do ensaio, além de finalizar com um comparativo com o SPT, o que possibilita uma correlação inicial de parâmetros.

A maior parte deste artigo foi embasada em duas publicações base:

Tese de mestrado:
ENSAIOS DILATOMÉTRICOS – DMT EM SOLOS DE SANTA CATARINA: ESTUDO COMPARATIVO COM CPT E SPT.

Livro:
MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO DO SUBSOLO.

Cujos link´s se encontram no final do texto nas referências bibliográficas.

Agradecemos aos profissionais que tem nos prestigiado ao longo deste processo e boa leitura.

Eng. Dário Furtado
Engenheiro Civil UFJF
Analista de Sistemas CES/JF
M.Sc. Engenharia COPPE/UFRJ


O DILATÔMETRO DE MARCHETTI – DMT

O DMT foi desenvolvido pelo Professor Silvano Marchetti por isso sua denominação Dilatômetro de Marchetti. Em sua concepção, Marchetti desenvolveu o DMT para medir a tensão in  situ e o modulo de deformabilidade do solo. Para reduzir as deformações devido a penetração no solo e, portanto, para melhor correlacionar o DMT com o comportamento pré-inserção, ele escolheu uma prova fina, em forma de lâmina, com uma membrana circular situada em uma das faces, como mostrado na figura 8 Quando comparada ao CPT, a lâmina, devido a sua forma geométrica impõe menores deformações ao solo.

FIGURA 1 – Lâmina do DMT. FONTE: In Situ testing

A lâmina é conectada ainda na superfície a unidade de controle (figura 2). Esta unidade é composta de válvulas de controle de fluxo de gás (nitrogênio, oxigênio ou ar comprimido) e ainda dois manômetros para o registro das pressões. Da unidade de controle parte ainda o cabo eletro-pneumático que passa pelo interior das hastes de cravação (tipo CPT) até ser conectado a lâmina do DMT. A corrente elétrica é fornecida por meios de pilhas ou baterias. (Paula, 1998)

A lâmina penetra verticalmente no interior da massa de solo, empurrada pelo sistema de cravação a velocidade constante (2 a 4 cm/s), a cada 20 centímetros interrompe-se a cravação, aplicando-se pressão por meio de gás, e por sua vez, inflando a membrana. Neste momento, são feitas três leituras, e logo após as leituras a membrana penetra mais 20 cm. Continua-se o ensaio desta forma sucessivamente.

FIGURA 2 – Fotos da unidade de controle (esquerda) e da lâmina penetrando no solo (direita). FONTE: FÁBIO KRUEGER DA SILVA.

Equipamentos do dilatômetro

A lâmina, cujos detalhes são mostrados na figura 1 consiste de uma placa de aço inoxidável, tendo uma membrana metálica circular fina expansível de 60 mm de diâmetro montada em uma das faces. O funcionamento geral de ensaio pode ser visto na figura 3. O fornecimento de corrente elétrica e de pressão de gás são providas pela unidade de controle através do cabo eletro-pneumático, o qual é ligado à lâmina. Internamente, um fio atravessa a lâmina até atrás da membrana. Onde existe uma área rebaixada para acomodação do disco sensor e da membrana, conforme figura 4. O disco sensor, é um dispositivo elétrico sensível de três posições, que assenta-se no centro dessa área. Este disco é dotado de pinos acionantes padronizados de maneira que ativem o sinal sonoro ao serem deslocados pela membrana.

FIGURA 3 – Esquema geral do ensaio. FONTE: Marchetti (1980)

A figura 4 indica o principio de funcionamento da membrana. A primeira condição de sinal ligado se dá pelo contato da membrana com o “espaçador” do disco sensor a uma distancia de 0,05mm deste. A segunda condição de sinal desligado se dá porque não há contato e o circuito é interrompido. A terceira condição se dá ao sinal ser ligado novamente quando o cilindro de aço inoxidável faz contato com o disco sensor reativando o sinal, posição em que a distancia do extremo do cilindro de plexiglass ao disco sensor tem exatamente 1,1mm. (Paula,1998).

FIGURA 4 – Princípio de funcionamento da membrana. FONTE: Marchetti (1980)

A membrana de aço inoxidável pode ter a espessura de 0,2 mm e 0,25mm, será dependente do tipo de solo estudado. Solos mais resistentes utilizam-se membranas mais espessas. Ela é relativamente rígida, o que requer que o operador aplique ciclos de expansão e contração da membrana, visando a sua calibração, antes e depois de cada sondagem. As leituras de pressão A e B são essenciais para correção dos dados. A unidade de controle tem como funções básicas monitorar e controlar a pressão de gás fornecida a lâmina e tornar perceptível a posição da membrana. Como se pode ver (figura 9) a unidade de controle possui 2 manômetros, calibrados em bars (1bar=100kPa); o primeiro fornece leitura de 0 a 10 bars, para maior precisão em pressões baixas; e o segundo leituras de 0 a 70 bars. Todo o conjunto que compõe o equipamento DMT é acompanhado de conectores, calibradores, cabos, chaves, peças sobressalentes etc. O cabo eletro-pneumático é um fio de aço inoxidável envolvido por um tubo de náilon com conectores especiais em cada extremidade. Através deste cabo é
fornecida corrente a lâmina. Para funcionamento do circuito elétrico é necessário que o equipamento seja aterrado. O fio terra parte da unidade de controle, e frequentemente é conectado a haste de cravação ou a outro ponto que possa fornecer aterramento. A fonte de pressão é nitrogênio ou ar comprimido fornecido em garrafas metálicas. A pressão de enchimento normal do nitrogênio é de 155 bars. Mas um regulador de pressão deve ser acoplado ao tanque para uma saída de 70 bars (70.000 kPa – máxima suportada pelo DMT) para a unidade de controle. A figura 5 a seguir mostra o equipamento de inserção do conjunto, igual ao usado no ensaio CPT.

FIGURA 5 – Foto da preparação do ensaio DMT. FONTE: FÁBIO KRUEGER DA SILVA.

Procedimentos para execução do ensaio

Em 1986, a ASTM padronizou a realização do ensaio DMT este fato contribuiu para coerência na execução do ensaio DMT em todo mundo aumentando sua reprodutibilidade. Para a execução do ensaio DMT devemos primeiramente montar o conjunto lâmina-cabos-unidade de controle. O cabo eletro-pneumático deve ser passado através das hastes metálicas e conectado a lâmina. Deve-se estar atento a correta posição que o fio de nylon deve ficar durante a ligação do cabo eletro-pneumático à lâmina. Isso implica no fechamento do circuito elétrico, essencial para o sucesso do ensaio.

Após o cabo passado pelas hastes ele deve ser conectado a unidade de controle. Neste momento já é possível testar o funcionamento do ensaio, ligando-se o fio terra e pressionando levemente com os dedos a membrana. Deve ser ouvido o sinal de áudio. Posteriormente, deve-se conectar o cilindro de gás à unidade de controle através de mangueira de ar com o conector adequado ao ensaio DMT. O regulador de pressão do cilindro já deve ser previamente instalado. A continuidade do circuito deve ser verificada. A lâmina é conectada à primeira haste de cravação e o ensaio já está pronto para ser executado. A calibração da membrana pode ser feita em algum momento antes do ensaio e será tratada a seguir.
O ensaio tem basicamente 4 passos. O primeiro passo consiste na inserção vertical da lâmina no solo, até a profundidade onde será feito a primeira leitura de pressões. Depois de finalizada a penetração, o próximo passo é abrir gradualmente a válvula de controle de fluxo (designada no equipamento por FLOW). Durante esse tempo, ouve-se um sinal de áudio vindo da unidade de controle. O sinal é interrompido quando a membrana é levantada de seu assento e justamente inicia seu movimento horizontal, ou seja, empurrando o solo. Neste momento toma-se a primeira leitura Pressão A (que após correção fornece a medida po). Esta leitura A deve ser obtida de 15 a 30 segundos depois do início do ensaio. O terceiro passo
continua com a expansão da membrana, pois a válvula de controle de pressão continua aberta injetando gás no sistema. Durante a expansão, o sinal de áudio permanece desligado e somente retorna quando a lâmina atingir o deslocamento horizontal de 1,1mm, que sinaliza o operador para a leitura da Pressão B ( após correção fornece a medida p1). A leitura B deve ser feita de 15 a 30 segundos após a leitura A. Após, usam-se as válvulas de ventilação e de relaxamento de fluxo para produzir um relaxamento de pressão até que a membrana retorne a sua posição inicial assentada. Opcionalmente pode-se fazer a leitura C, ventilando-se a pressão após a leitura B rapidamente, até que o sinal da pressão B seja interrompido e, em seguida despressurizando lentamente até que o sinal seja reativado. Neste momento, registra-se a pressão C (após correção fornece a medida p2). Alguns pesquisadores (e.g. Mayne, 2006) relacionam a leitura C com o excesso de pressão neutra do solo. Acredita-se que no momento em que a membrana inicia o retorno a sua posição inicial, pela relaxação da pressão do sistema, a água no interior dos grãos imprima na membrana uma pressão similar a poro pressão. Isso completa a seqüência do teste, e a lâmina é avançada com uma velocidade de 2 a 4 cm/s até a próxima profundidade.

Calibração da membrana

A base física do ensaio consiste na expansão da membrana dentro da massa de solo. Geotecnicamente o interesse está em avaliar somente as grandes deformações do solo. Como a membrana está entre o gás e o solo, e não poderia ser diferente, precisamos descontar a rigidez que a membrana oferece durante a movimentação de aplicação do gás. Por esta razão é que calibramos o equipamento a pressão atmosférica de acordo com critérios pré-estabelecidos. (Gomes Boehl, 2005)

FIGURA 6 – Foto da calibração da membrana com seringa (acessório). FONTE:  FÁBIO KRUEGER DA SILVA.

As pressões para vencer a rigidez da membrana são chamadas de A e B. Esses valores são obtidos antes da execução do ensaio através de ciclos de sucção e expansão da membrana, executado com calibrador apropriado. A membrana montada na lâmina repousa em algum lugar entre a posição de Pressão “A” a 0,05 mm de retração e a posição de Pressão “B” a 1,1 mm de expansão. O equipamento foi concebido de forma que a resistência para defleccionar a membrana para dentro e para fora se mantenha constante durante a execução do ensaio, de forma que o operador possa determiná-la. Nisso consiste a calibração da membrana, isto é, determina-se a pressão necessária, ao ar, para defleccionar a membrana para as posições da Pressão-A (ou leitura A) e Pressão-B (ou leitura B). Tais calibrações, denominadas A e B, respectivamente, são depois utilizadas para corrigir as leituras de ensaio. (Paula, 1998). Para se obter as calibrações A e B devemos realizar ciclos de sucção e expansão da membrana, antes e após a execução do ensaio. Devemos ainda lembrar que membranas novas devem, antes, ser exercitadas para que “perca” um pouco da sua resistência original, e adquirida a rigidez necessária para o bom funcionamento do ensaio. Nos acessórios que compõe o kit para execução do ensaio DMT existe uma seringa de calibração que é conectada a unidade de controle para injeção de pressão de ar no sistema (figura 6). A lâmina do DMT é acoplada na unidade de controle, tem-se início a aplicação de expansão na membrana. Quando ela atingir o deslocamento de 1,1mm o apito irá soar e deve-se anotar a pressão neste momento. A seguir, inicia-se a sucção da membrana até esta atingir uma contração de 0,05mm quando o apito irá soar novamente e deve-se registrar a pressão indicada no manômetro da unidade de controle. Este procedimento deve ser realizado no mínimo de 3 vezes para se obter valores Aantes e Bantes. Após a realização do ensaio deve-se repetir o procedimento e anotar os novos valores de Adepois e Bdepois. Os índices A e B finais que serão aplicados para redução dos dados são a medias aritméticas de Aantes + Adepois e Bantes + Bdepois. Existe também uma mini-calibrador (acessório opcional) que acompanha o equipamento e simplifica a calibração da membrana. Mais é recomendável calibrar a membrana na unidade de controle. Valores típicos de A e B são respectivamente, 15 kPa e 45 kPa, com uma variação aceitável de A entre 5 e 30 kPa e B de 5 a 80 kPa. Os dois métodos devem ser empregados para confirmação dos valores de A e B.

Vantagens e desvantagens do DMT

Como já sabemos os ensaios de campo apresentam certas vantagens em relação aos ensaios de laboratório. No DMT, devido a sua inteligente concepção podemos destacar vantagens exclusivas deste ensaio, podendo citar (Schertmann, 1988):

  • rapidez de execução;
  • fácil operação;
  • equipamento portátil e simples, sem sofisticação eletrônica;
  • pequena deformação da membrana, na faixa elástica do solo;
  • boa confiabilidade dos resultados;
  • resultados altamente reproduzíveis;
  • tratamento de dados do ensaio rápido, por computador (software DMTElab);
  • alto potencial de perfuração independente;
  • resultados aplicáveis a casos comuns de engenharia;
  • perfil contínuo do solo com leitura a cada 20cm
  • pode ser correlacionar com outros ensaios específicos reduzindo o custo das investigações;
  • mais econômico que ensaios mais sofisticados;

Segundo Schmertmann (1988) o Dilatômetro de Marchetti fornece informações confiáveis, independentemente de outros ensaios, e pode ser usado com ferramenta de investigação primária. Porém indicou para um conhecimento preliminar da área a utilização de sondagens preliminares a trado, SPT e CPT. Este procedimento reduziria potenciais danos e um conhecimento mais detalhado da área. Citou, ainda, a necessidade de estar atento à aplicação do DMT cujos resultados possam gerar dúvida, quando não se possui informações de outras áreas, devem-se considerar as seguintes limitações:

  • o tipo de solo determinado com o uso do DMT pode ser duvidoso, por exemplo, uma argila arenosa pode ser interpretada como silte. Este fato é relatado por Marchetti em 2001, onde ID (tipo de solo) é um parâmetro que reflete o comportamento mecânico do solo;
  • não são obtidas amostras de solo;
  • solos sensíveis, alterados pela penetração da lâmina (areias cimentadas), apresentam resultados muito conservadores;
  • a penetração dinâmica afeta os resultados;
  • a poro-pressão da água no interior do solo é assumida como sendo a pressão hidrostática, o que nem sempre é verdade;
  • as estimativas razoáveis de tensão vertical são importantes, recomendando-se obter medidas separadas do peso específico para melhores resultados;
  • se a lâmina não mantiver a verticalidade durante a penetração, os resultados serão afetados;
  • possibilidade de dano a membrana em casos de solos com pedregulhos, matacões etc;
  • em solos com camadas superficiais espessas e muitos moles, o ensaio pode apresentar problemas de ancoragens (Paula, 1998).

Referências:
Silva, Fábio Krueger da. ENSAIOS DILATOMÉTRICOS – DMT EM SOLOS DE SANTA CATARINA: ESTUDO COMPARATIVO COM CPT E SPT, Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Tecnológico. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, 2008.
Marques, Abel Galindo et al. Métodos de Investigação do Subsolo, EDUFAL, 2015.

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